Incertezas e Esperanças na casa comum

Construir o Futuro em tempos de transformação

Luís Mah

Luís Mah

Professor Auxiliar em Estudos de Desenvolvimento no ISCTE.

Trabalha há mais de 19 anos com organizações da sociedade civil e entre 2007-2010 liderou a Campanha do Milénio das Nações Unidas em Portugal.

O título do último Relatório do Desenvolvimento Humano (2021/2022) do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) 1, apresenta-nos o que chama o “novo normal” na casa comum em que vivemos e de que temos de cuidar. Um “novo normal” feito de crescentes incertezas e inseguranças humanas.

elatório do Desenvolvimento Humano (2021/2022) do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD)

Aos impactos que ainda se vão sentindo da pandemia e do horror e sofrimento da Guerra na Ucrânia, juntam-se três grandes incertezas que marcam e continuarão a marcar as nossas vidas nas próximas décadas ou mesmo séculos, num cenário global cada vez mais perturbador e inquietante.

Primeiro, a incerteza das mudanças planetárias causadas pela emergência climática resultado da ação humana (ou Era do Antropoceno como realça o relatório) e que prometem intensificar ainda mais as desigualdades humanas já de si problemáticas.

Segundo, a necessidade de responder a estas mudanças planetárias, acaba por gerar uma outra incerteza, principalmente laboral, com as transformações na organização das sociedades. A emergência de novas indústrias mais amigas do ambiente que exigem outras (re)qualificações profissionais ou a introdução da automação e da inteligência artificial em substituição da mão-de-obra humana têm vindo a alimentar uma crescente insegurança económica junto dos trabalhadores, desafiando o seu bem-estar.

Finalmente, a incerteza causada pelo reforço da polarização política e social entre e dentro dos países e a sua relação com a proliferação das redes sociais. O extremismo político, facilitado e exacerbado pelas novas plataformas tecnológicas e que emerge associado a uma visão cada vez mais crítica e desconfiada quanto ao papel dos governos, acaba por ter como efeito reduzir as possibilidades de cooperação e colaboração cruciais para se encontrarem consensos em políticas públicas destinadas a ajudar a mitigar e a adaptar aos efeitos da emergência climática. Cuidar da casa comum está a ser cada vez mais difícil.

Mas ainda há esperança para tornar as pessoas mais seguras na casa comum. Através de três ações como, por exemplo:

  • investimento em medidas que ajudem a enfrentar a emergência climática, apostem no desenvolvimento humano centrado na valorização da natureza e providenciem bens públicos mundiais como a educação ou saúde para todos;
  • proteção dos direitos humanos e dos serviços sociais básicos, da promoção do debate público e da participação social;
  • e através da inovação social, do combate à desinformação e da eficiência energética.

Este relatório (também conhecido pela sigla RDH) foi publicado pela primeira vez em 1990, e na sua origem esteve a vontade de criar uma abordagem que avaliasse o processo de desenvolvimento com o ser humano no seu centro e a quem seriam dadas as oportunidades e liberdades para alcançar o seu bem-estar.

Todos os anos o RDH lança o chamado Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) que mede os países segundo o que se considera ser as três dimensões básicas do desenvolvimento humano: anos de escolaridade, anos de longevidade e rendimento per capita. Desde a sua criação, o IDH tem vindo a sofrer modificações e ajustamentos de modo a melhor refletir novas realidades.

O progresso positivo do IDH nas últimas três décadas é evidente. Mas o que este último RDH vem revelar é que esse progresso está agora ameaçado se não agirmos imediatamente.


(1) PNUD 2022, Tempos Incertos, Vidas Instáveis: Construir o Futuro em Tempos de Transformação, PNUD: Nova Iorque. Sumário executivo e versão completa disponíveis em: https://hdr.undp.org/content/human-development-report-2021-22 .

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