Do amor e de livros (não é sobre o amor aos livros)

Desde janeiro de 2017 que coordeno um Clube de Leitura, sediado na paróquia de São Tomás de Aquino, em Lisboa. Na primeira “temporada”, lemos livros sobre grandes famílias. Nesta segunda edição, estamos a ler livros que tenham sido adaptados ao cinema ou à televisão (permito-me deixá-los no final, como sugestão de leitura).

Mensalmente, encontramo-nos para falar sobre um livro e cada sessão é orientada por uma pessoa diferente. Tem sido uma das experiências mais enriquecedoras e gratificantes da minha vida, pela amizade que encontrei, pelos conhecimentos que tenho adquirido e pelas leituras que vimos partilhando. Lemos autores estrangeiros e autores portugueses e o critério norteador na escolha das obras, além do tema geral do Clube, tem sido somente a escolha pessoal dos convidados a orientar as sessões.

Ora, no encontro de 11 de janeiro passado, às 14h30, uma hora que aparentemente “não dá jeito” e que tem menos pessoas, a biblioteca onde nos reunimos estava cheia; foi enchendo até ser preciso ir buscar mais cadeiras à sala do lado e reorganizar o espaço. Uma surpresa, mesmo, com muitas caras novas entre os leitores presentes.

Mau tempo no canal

Clube de Leitura, paróquia de São Tomás de Aquino, LisboaConversávamos nesse frio dia de inverno sobre Mau tempo no canal, de Vitorino Nemésio (1901-1978). A orientadora do encontro, a minha amiga Catarina Duff Burnay, falou-nos sobre a açorianidade e sobre a adaptação da obra a uma minissérie com o mesmo título, produzida pela RTP Açores. Prometia ser interessante e cumpriram-se as expetativas. Aliás, posso afirmar sem hesitações e com alegria que, dos nove encontros que tivemos até ao momento, todos foram ricos em reflexão e diálogo.

Como se faz um clube de leitura

Como lhes dizia antes, cada encontro é orientado por uma pessoa diferente, uma opção que arriscava tornar-se “fragmentadora” do projeto. Neste momento, é minha convicção que a variedade dos orientadores é uma das razões do dinamismo e – digo-o com carinho – do entusiasmo que os leitores deste grupo têm em relação ao Clube de Leitura.

É quase lugar-comum dizer que a leitura de um livro nunca se esgota, mas a banalidade da afirmação não lhe retira nada do acerto que contém. As “nossas” sessões têm sido sempre diversas, enveredando por caminhos inesperados tanto pelas preferências de quem orienta, como pela participação ativa de quem assiste: já acabámos a falar sobre papagaios, sobre o processo de edição de bestsellers ou sobre a nobre e silenciosa arte da tradução, entre outros temas.

Alunas de Vitorino Nemésio

Mas regressemos a dia 11 de janeiro e à sala inusitadamente cheia. Perguntei às “caras novas” como tinham ouvido falar do nosso Clube de Leitura e porque tinham decidido vir. A maioria respondeu que fora por terem sido alunas (sim, não havia nenhum aluno) do autor do livro, Vitorino Nemésio.

A decana das alunas/ leitoras presentes tem mais de oito décadas de uma alegria contagiante, mas outras ali estavam também, a recordar as aulas desse professor de memorável fama e, pela afetuosa amostra, inesquecível proveito.

Livros e amor

É certo que muito se fala sobre o amor aos livros, mas esta experiência de amor e de livros que é o Clube de Leitura, mostrou-me que, entre livros, o maior amor é pelas pessoas. Elas estão nos livros, é verdade. Autores que os fazem matéria e no-los deixam como legado espiritual.

As diversas formas do amor não são concorrentes nem incompatíveis, mas a todos confesso como me comove, me consola e me ensina, este amor tão discreto como mobilizador que numa tarde fria de inverno, 40 anos após a morte do autor, encheu de pessoas, de memórias e de alegria, a singela sala de uma biblioteca paroquial.

Podem espreitar a página de Internet do Clube de Leitura em https://clube-de-leitura-sta.webnode.pt/

Clube de Leitura, paróquia de São Tomás de Aquino, LisboaSugestões de leitura, histórias sobre famílias:

  • A lebre de olhos de âmbar, Edmund de Waal
  • Nação Crioula, José Eduardo Agualusa
  • Os Maias, Eça de Queirós
  • Cem anos de solidão, Grabriel García Márquez 12 IMG_20171211_215858_1
  • A harpa de ervas, Truman Capote
  • “Homenagem ao papagaio verde”, Os grão-capitães, Jorge de Sena

Sugestões de leitura, histórias adaptadas ao cinema ou à TV:

  • Manhã submersa, Vergílio Ferreira
  • A rapariga no comboio, Paula Hawkins
  • Mau tempo no canal, Vitorino Nemésio
  • A costa dos murmúrios, Lídia Jorge
  • O Delfim, José Cardoso Pires
  • Mataram a cotovia, Harper Lee
  • Silêncio, Shusaku Endo.

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