O perdão é o maior gesto de que um ser humano é capaz: é a última etapa do caminho de humanização de cada pessoa. O perdão – podemos dizê-lo – faz bem antes de mais à vítima, que sai de si mesma, conhece uma paz mais alargada, sente-se mais livre.
Há experiências cuja reflexão sobre elas exige humildade e coragem: experiências que marcam a nossa história e o nosso quotidiano, e das quais qualquer pensamento pode pecar pela superficialidade ou pelo idealismo. O perdão é uma dessas experiências. É por isso um ato de coragem a proposta – tão breve como significativa! 112 páginas em formato de bolso – do monge italiano Enzo Bianchi. Procurando não cair nas respostas fáceis ou imediatas, Bianchi faz acompanhar o seu ensaio sobre o perdão na vida humana de duas outras dimensões que fazem parte do centro, do coração da vida cristã: o dom e a compaixão. Juntas, acompanham o perdão, e permitem compreender como este só faz sentido unido àquelas.
O dom e a compaixão – como o perdão – têm riscos, nem sempre encontram a gratidão ou o acolhimento, a correspondência ou o reconhecimento. Como não confundir o perdão com a desculpa, o esquecimento ou até a reconciliação (no sentido em que esta exige a aceitação da outra pessoa, algo que nem sempre acontece com o perdão)? Aqui, Enzo Bianchi é tão perspicaz quanto profundo:
Perdoar é um processo longo e exigente, que deve conduzir a uma transformação dos sentimentos, das intenções, dos comportamentos da vítima, de quem foi ofendido, relativamente ao ofensor. Trata-se, em primeiro lugar, de saber ler e discernir, o mais possível na verdade, a ofensa recebida; trata-se, portanto, de renunciar a responder na mesma moeda, de elaborar uma mudança em nós mesmos.
Dom e Perdão constitui assim um breve e muito rico itinerário espiritual de encontro com as texturas humanas e cristãs da vivência do perdão. O autor parte da tradição espiritual bíblica e cristã como narrativa da busca do Deus de amor por cada mulher e cada homem, para os reconciliar com a sua própria vida e história. O cristão, neste sentido, tem o dom de contemplar a beleza do Evangelho, não anulando as feridas mas convidando a um caminho de renascimento. Não se trata de esquecer a injustiça, o mal ou o pecado, “de que somos vítimas e de que somos culpados”: mas a resposta cristã não consiste na vingança ou no esquecimento, mas na compaixão, no perdão, na não-violência. É a Cruz o perfeito ícone disso.
As respostas não serão todas dadas, as perguntas não serão todas respondidas, as feridas não serão – longe disso! – saradas ou cicatrizadas, os primeiros passos poderão não ser dados: mas a leitura deste pequeno opúsculo certamente constituirá um precioso auxílio no caminho pessoal de cada leitora e leitor.
O perdão é o maior gesto de que um ser humano é capaz: é a última etapa do caminho de humanização de cada pessoa. O perdão – podemos dizê-lo – faz bem antes de mais à vítima, que sai de si mesma, conhece uma paz mais alargada, sente-se mais livre. Perdoar restabelece, é bálsamo sobre as feridas, que de chagas se tornam cicatrizes. Perdoar é um evento que instaura nas relações uma maior confiança, um acolhimento mais cordial, uma comunhão mais intensa. Não por acaso, para a tradição cristã, esta é a maior alegria de Deus.
Autor: Enzo Bianchi
Edição: Apostolado da Oração
Páginas: 112