Desde o meu ‘primeiro’ Moretti (Querido Diário) – e não os vi todos – que fiquei amarrado a esta maneira ‘minimalista e palavrosa’ de fazer cinema; àquelas circum-reflexões repetidas, como quem procura encontrar – obsessivamente – uma saída. Para o futuro. Seja ele mais pessoal, familiar ou político.

Percebemos, desde logo, que este O Sol do Futuro regressa ao passado para nos deixar – com uma nostalgia nunca disfarçada – um caminho para diante, magnificamente significado naquela ‘procissão’ final carregada de esperança.
Giovanni (o nome próprio de Moretti, Nanni é o diminutivo) é um realizador um pouco bloqueado (também pela falta de financiamento) para fazer o filme que tem em mãos. Estamos em 1956, quando toda a gente estava suspensa da resposta que a União Soviética iria dar à revolta acontecida na Hungria, e Giovanni está num bairro popular, na importante célula comunista local, no momento em que esse bairro passa a ter luz elétrica.
As perguntas que estão por detrás deste O Sol do Futuro (e às quais Moretti já se esforçou por responder, por exemplo, em Palombella Rossa – onde aparecia reiteradamente a pergunta “o que é ser comunista?”) tentam imaginar como poderia ter sido diferente a vida dos italianos se o dirigente do Partido Comunista Italiano da altura tivesse sido capaz de romper com a União Soviética.
Moretti sabe, como nós sabemos, que é impossível responder a essas perguntas. Ainda assim vai andar à volta delas, angustiado, ‘misturando’ o argumento do filme com as dificuldades do realizador. E vai reescrever a História. A ficção permite essa ousadia.
Tudo isto feito ‘a la Moretti’, quer dizer, com muita ironia, muito sarcasmo, muito humor, muita rezinguice e rabugice, e muitas, muitas palavras. No fundo, trata-se de um filme que, situando-se no passado, o que quer questionar e entender é o presente do mundo, da sociedade e, também, do cinema.
É um filme sobre um momento de crise da identidade comunista, bem entendido, que dividiu quem condenava a agressão da URSS e quem não ousava quebrar a lealdade. Da mesma maneira que ‘O Sol do Futuro’ é um filme sobre a crise de um cineasta, que, perante as novas lógicas de produção, e perante um argumento que a certa altura começa a misturar-se com a vida (a política versus o amor, etc.), não sabe que posição tomar.
Inês N. Lourenço, DN, 28 de setembro de 2023
No fundo, “O Sol do Futuro” é a história de um homem que aceita a idade que tem e que segue a sua estrada. Não perde a verve e a paixão. Nem vende a alma.
Francisco Ferreira, Revista do Expresso, 29/09/2023
Mas quando tudo parecia sem saída, o realizador consegue o financiamento e vai alterar tudo, o argumento e a História, uma espécie de
happy end: O Sol do Futuro. E isso, convenhamos, não é coisa pouca…
O Sol do Futuro, Nanni Moretti, Comédia Dramática, M/12, 2023, IT/FRA