No cubículo do Pai e da consciência

A Palavra de Deus

Naquele tempo, disse Jesus aos seus discípulos: “Tende cuidado em não praticar as vossas boas obras diante dos homens, para serdes vistos por eles… Assim, quando deres esmola, não toques a trombeta diante de ti, como fazem os hipócritas, nas sinagogas e nas ruas, para serem louvados pelos homens. Em verdade vos digo: já receberam a sua recompensa. Quando deres esmola, não saiba a tua mão esquerda o que faz a direita, para que a tua esmola fique em segredo; e teu Pai, que vê o que está oculto, te dará recompensa.
Quando rezardes, não sejais como os hipócritas, porque eles gostam de orar de pé, nas sinagogas e nas esquinas das ruas, para serem vistos pelos homens. Em verdade vos digo: já receberam a sua recompensa. Tu porém, quando rezares, entra no teu quarto, fecha a porta e ora a teu Pai em segredo; e teu Pai, que vê o que está oculto, te dará a recompensa”.

Mt 6, 1-6

A palavra de Santo António

Não o digas a ninguém.
Não procedem assim aqueles que, quando fazem algum bem, tocam a trombeta diante de si e cuja direita sabe o que faz a esquerda.
Ó infeliz comércio! Vender pelo vento da boca humana o prémio do reino celeste! Vê: não digas a ninguém, não mostres a ninguém as tuas coisas.

Não te basta, ó irmão, Deus e a tua consciência?
Que há entre ti e a língua do homem, que condena o que deve ser louvado e louva o que deve ser condenado, que precipita o justo até ao profundo do inferno, exalta, porém, o impio até ao trono de Deus e do Cordeiro ?

Quando orares, entra no teu quarto e, fechada a porta, ora ao teu Pai…
Entra no teu cubículo, isto é, no segredo do teu coração e fecha a porta dos cinco sentidos, para não te apetecer ser visto, ouvido ou louvado…
Na hora da oração, qual incenso a subir à presença do Senhor, deves entrar no templo de teu coração e desta maneira orarás ao teu Pai, e o teu Pai, que vê no segredo, te recompensará.

Sermões de Santo António

Aprofundemos

António, como cónego regrante de Santo Agostinho, teve a oportunidade de experimentar a ressonância interior da espiritualidade de seu fundador e mestre. As duas citações extraídas do Soliloquia e das Confissões atestam: “Senhor, faz que te conheça a ti e a mim”; “Senhor, o meu coração está inquieto enquanto não repousar em Ti”, porque o nosso verdadeiro lugar, a morada fixa de todo homem é Deus. António, portanto, está em perfeita sintonia com o ensinamento de Jesus quando ensina a apreciar o valor das práticas quaresmais, as boas obras, a oração e o jejum, não das aparências, mas da fonte íntima e secreta de onde brotam os desejos e as ações, isto é, Deus e a consciência.

Não proclameis na praça pública o bem que fazeis, para serdes aprovados pelos transeuntes. O seu julgamento não só é enganoso − pois condena o que merece elogios e elogia o que deve ser condenado − como é superficial, porque não vê o fundo do coração. Só Deus, que perscruta os pensamentos, e a tua consciência, quando sabe distinguir o bem do mal, podem conseguir isso.

O mesmo também é verdade para a oração e o jejum. Portanto, quando rezares, fecha bem a porta do teu quarto interior, para não deixar entrar nada que satisfaça a tua curiosidade e vaidade, porque isso não tem nenhum valor para Deus. O mesmo se diga a propósito, do jejum. Não vale a pena mostrar o rosto triste, pálido, para comover o público, mas lava e perfuma o rosto e mostra-te alegre, porque quem julga a tua boa vontade e sinceridade é o teu Pai, que vê o que há de verdadeiro e bom no íntimo do teu coração.

Entra, pois, no cubículo do teu coração e da tua consciência, porque é aí que te encontras a ti mesmo e a Deus.

Foto da capa: Mulher tocando harpa no Portão de Jaffa, na Cidade Velha de Jerusalém. Foto EPA/ABIR SULTAN, 2014

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