O caminho do homem

O filósofo austríaco Martin Buber (1878-1965) representa uma das vozes mais significativas do século XX, um século marcado por violências nunca antes vistas e, ao mesmo tempo, por um desenvolvimento humano e técnico que trouxe a Humanidade para um novo patamar de bem-estar, ainda que de uma forma muito desigual. Originário de uma família judia praticante, Buber elaborou um original pensamento filosófico em diálogo com a sua tradição religiosa, na qual a dimensão da relação (divina e humana) é colocada no centro.

O Caminho do Homem tem como origem uma conferência pronunciada por Buber em 1947 numa universidade norte-americana, na qual apresenta uma particular sabedoria judaica para a existência: a tradição do Hassidismo, que Buber aprendeu do seu avô paterno. O hassidismo propõe uma experiência sapiencial de leitura das Escrituras, expresso em breves histórias e provérbios. Com uma introdução da autoria de Manuel Duarte de Oliveira, O Caminho do Homem apresenta-se em seis passos: “retorno a si mesmo”, “o caminho particular”, “determinação”, “começar por si mesmo”, “não se ocupar de si” e “onde se está”.

A busca de uma sabedoria de vida dá-se na elaboração de perguntas fundamentais que, ao invés de causarem angústia ou perturbação, ajudam o crente a elevar o olhar para a sua vida e o seu lugar: “Em todo o tempo Deus interpela cada homem: Onde estás tu no teu mundo? Dos anos e dos dias que te foram atribuídos, já muitos passaram; até onde, entretanto, chegaste no teu mundo?“. Longe de todas as ideologias ou projetos imaginários, as perguntas sapienciais situam o crente na sua relação única e singular com o Deus de Israel, que é também o Deus de Jesus. E cada um nas circunstâncias concretas da sua existência, que são o lugar único e original para servir o advento do reinado divino: «Há algo que só se pode encontrar num único lugar do mundo. É um grande tesouro: pode dar-se-lhe o nome de realização da existência. E o lugar onde se encontra este tesouro é o lugar onde se está».

O leitor que se abeire de O Caminho do Homem encontrará um livro singular, para uma leitura pausada, que sem dúvida terá como efeito aproximar da presença do Deus que peregrina com o seu povo. Podemos, por exemplo, encontrar esta sabedoria de vida sintetizada no seguinte relato, uma pérola de sabedoria tanto mais preciosa, quanto poucas são as palavras que a constituem:

Rabi Mendel de Kotzk dizia um dia à comunidade reunida: “Que é que exijo de cada um de vós? Apenas três coisas: não olhar para fora de si, não olhar de soslaio para o vizinho e não pensar em si”. Quer isto dizer: primeiro, cada um deve preservar e santificar a sua alma no seu jeito próprio e no seu lugar peculiar, e não cobiçar o modo e o lugar dos outros; em segundo lugar, cada um deve respeitar o mistério da alma do seu próximo, abster-se de, com insolente indiscrição, o sondar e dele se servir; e, em terceiro lugar, cada um, na vida consigo mesmo e na vida com o mundo, deve guardar-se de se tomar a si mesmo como meta.

O caminho do homem
Autor: Martin Buber
Edição: Paulinas
Páginas:88

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