Num mundo com tanta tendência para o descartável, o passageiro e o consumo imediato, serão ainda possíveis atitudes contracorrente?
A Associação Santa Teresa de Jesus – Dignidade e Desenvolvimento, propôs-se desenvolver no bairro Quinta Fonsecas e Calçada, em Lisboa, numa lógica de intervenção comunitária, uma Oficina de Costura assente em três pilares essenciais: a sustentabilidade ambiental, a sustentabilidade económica e a sustentabilidade social.
O ambiente sofre devido ao nosso modelo de consumo. Assumindo que a indústria têxtil é das mais poluentes, o desafio, a nível local, foi diminuir ao máximo esse impacto, criando alternativas para o uso das matérias-primas e dos produtos excedentes.
Assim, dedicamo-nos a reciclar roupa usada, tecidos acumulados pela indústria e outros produtos têxteis, aos quais, com alguma criatividade, damos uma segunda vida e múltipla utilidade.
Transformamos calças de ganga em aventais, de vestidos fazemos mochilas e de cortinados lancheiras – damos nova vida ao que aparentemente já não servia, para que, com outra forma, outro tamanho e feitio, volte a servir novos utilizadores, tanto particulares como empresas.
O modelo de compra, venda, uso e descarte precisa de alternativas e, aí, a economia circular, aliada à economia solidária e à economia local, faz todo o sentido. É uma opção exigente, mas cada vez mais aceite e procurada.
Há que escolher produtos que
- percorrem o circuito da redução, reutilização, recuperação e reciclagem dos seus materiais;
- respeitam os princípios da economia solidária ao promover a autogestão, o sentido democrático nas decisões, a cooperação entre os envolvidos ou a justiça na compra e venda;
- promovem a responsabilidade ambiental ao incentivar a produção e consumo local, diminuindo o impacto no território e na natureza.
Esta é uma opção consciente, para que a economia dominante seja contrariada a favor do bem comum.
Na verdade, o consumidor detém poder através da sua exigência nos consumos que faz, tal como preferindo produtores locais e não apenas vendedores locais. Tão importante como saber consumir é saber usar, com responsabilidade e sentido crítico.
As pessoas são parte fundamental de uma ecologia integral. Este processo não teria o mesmo alcance se não se centrasse na valorização das pessoas que dele beneficiam e dele fazem parte, dando-lhe maior sentido.
De facto, as pessoas na Oficina de Costura participam a diferentes níveis: identificando as necessidades, em pequenas decisões, apontando caminhos e soluções, melhorando conhecimentos e apercebendo-se das evoluções necessárias, criando pontes com e na comunidade, como elementos ativos e não apenas beneficiários do processo.
Esta dinâmica possibilita, assim, capacitação, inclusão, desenvolvimento e protagonismo dos mais vulneráveis no seio da sua comunidade, com ela e por ela.
Todos estamos interligados numa casa comum, nomeadamente, através da relação entre a natureza e a sociedade que a habita.
Muitas vezes olhamos para o meio ambiente por si só, esquecendo que as pessoas também o influenciam e são influenciadas por ele – daí a necessidade de reconexão com a natureza.
A exigência ética de preferência e acompanhamento dos mais pobres e excluídos levará naturalmente a trocar a cultura corrente do descarte, inclusive de pessoas, pela atitude de reparação e de cuidado como primeira opção.
A máxima “pensar global, agir local” alerta, de forma muito atual, para o impacto da representatividade na vida das pessoas.
Em que território vivo e que significado ele tem para mim e para os outros?
Esta questão pode determinar o nível de valorização e investimento feito no mesmo e nos seus moradores, criando ou destruindo. Dependerá de nós e das nossas opções.

Lisandra Rodrigues
Com múltiplos interesses e motivações, sou natural de Santo Tirso, sou coordenadora técnica na Associação Santa Teresa, de projetos de intervenção comunitária nas áreas de Educação e do Emprego, sou Terapeuta da fala, pós graduada em Neuropsicologia e em Economia Social e Solidária, apaixonada pela Revisão de Vida e pela Pastoral Operária, fui membro da JOC - Juventude Operária Católica, dirigente livre e presidente nacional do movimento entre 2014 e 2017.
Foto da Capa: Associação Santa Teresa de Jesus Dignidade e Desenvolvimento. Fotos em https://facebook.com/asantateresa.org/photos/
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