Tempo da Criação: Tempo para a profecia

O Dicastério para o serviço do Desenvolvimento Humano Integral convidou todas as comunidades cristãs a desenvolverem iniciativas no ano do Aniversário Especial da Laudato Si’, para responder ao grito da terra e ao grito dos pobres.

Dentro desta dinâmica, o Secretário do Dicastério, Dom Bruno-Marie Duffé, dirigiu, em 24 de maio passado, uma carta a todos os cristãos, convidando-os a unir-se à família ecuménica, para celebrar o Tempo da Criação. Nessa carta podemos ler o seguinte:

Inspirados na exortação apostólica Querida Amazónia encorajamos o povo de Deus a acelerar os seus passos em busca de novos caminhos para a Igreja e para uma ecologia integral, planificando atividades para o Tempo da Criação.

A experiência da pandemia, que ainda estamos todos a viver, mostra-nos, sem margem para dúvidas, que este é mesmo o tempo oportuno para introduzirmos, na vida das nossas sociedades e também, na vida da Igreja, as mudanças necessárias, em ordem a construirmos um mundo diferente.

Já o escrevi aqui e volto a reafirmá-lo, ter como objetivo principal voltar ao ponto em que estávamos antes de tudo isto ter começado, parece-me, sinceramente, uma meta mal escolhida. Na Igreja e no mundo precisamos de começar a realizar já as mudanças necessárias.

Tempo de curar as estruturas injustas

Manifestantes durante protesto após a explosão, em Beirute, no Líbano, a 8 de agosto de 2020, exigem mudanças na política do país e o fim da corrupção.
Manifestantes durante protesto após a explosão, em Beirute, no Líbano, a 8 de agosto de 2020, exigem mudanças na política do país e o fim da corrupção. EPA/WAEL HAMZEH

Muito atento a tudo isto o papa Francisco propõe-se iniciar um conjunto de reflexões que nos podem servir de linhas orientativas para este caminho:

Um novo encontro com o Evangelho da fé, da esperança e do amor convida-nos a assumir um espírito criativo e renovado. Desta forma, poderemos transformar as raízes das nossas enfermidades físicas, espirituais e sociais. Poderemos curar profundamente as estruturas injustas e as práticas destrutivas que nos separam uns dos outros, ameaçando a família humana e o nosso planeta.

(Audiência Geral, 5 de agosto 2020)

E, sabendo bem que a Igreja não tem como missão desenvolver as técnicas específicas para enfrentar a pandemia, nem lhe compete a ela tomar as decisões políticas que cabem aos governos legitimamente eleitos, não deixa, contudo, de apontar princípios que podem e devem ser tidos em conta nesta fase em que todos os povos e nações são chamados a reorganizar-se:

[…] , ao longo dos séculos e à luz do Evangelho, a Igreja desenvolveu alguns princípios sociais que são fundamentais (cf. Compêndio da Doutrina Social da Igreja, 160-208), princípios que nos podem ajudar a ir em frente, a preparar o futuro de que necessitamos. Cito os principais, que estão intimamente ligados entre si: o princípio da dignidade da pessoa, o princípio do bem comum, o princípio da opção preferencial pelos pobres, o princípio do destino universal dos bens, o princípio da solidariedade, da subsidiariedade e o princípio do cuidado pela nossa casa comum. Estes princípios ajudam os dirigentes, os responsáveis pela sociedade, a promover o crescimento e, inclusive, como neste caso de pandemia, a cura do tecido pessoal e social. Todos estes princípios expressam, de diferentes maneiras, as virtudes da fé, da esperança e do amor.
(Ibidem)

Inspirados por estes princípios, podemos, com a criatividade e a coragem necessárias, celebrar este tempo de criação de uma maneira diferente, de modo a que não corra o perigo de ficar reduzido a um mero ‘picar o ponto’, ou a um simples visto na listagem de boas ações que pretendemos realizar, que podem ajudar a apaziguar as nossas consciências, mas que verdadeiramente não mudam as nossas mentalidades, nem os nossos estilos de vida.

Neste momento, fazer as coisas só para dizer que as fizemos não só não nos ajudará, como acabará por tornar tudo bem mais difícil, pois o faz de conta não é solução para nada.

Também nós cristãos temos de assumir responsabilidades a este nível. Não podemos continuar a dizer que estamos empenhados no cuidado da casa comum, não traduzindo isso por gestos concretos, por mudanças visíveis nas nossas maneiras de viver, por novas formas de comprometer as nossas comunidades nas mudanças urgentes.

Façamos deste tempo da criação um tempo para a profecia! Porque é preciso acelerar os passos…

Senhor, tomai-nos
sob o vosso poder e a vossa luz,
para proteger cada vida,
para preparar um futuro melhor,
para que venha o vosso Reino
de justiça, paz, amor e beleza.
Louvado sejais!
(LS 246)

O Tempo da Criação decorre do dia 1 de setembro, Dia Mundial de Oração pelo Cuidado da Criação, ao dia 4 de outubro, Solenidade de São Francisco de Assis.
Foto da Capa: Fábrica de cerâmica nos arredores de Amã, Jordânia, retoma o fabrico após as restrições impostas pela COVID-19. Foto EPA/Andre Pain.

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