Frei Flávio, natural da cidade de Marabá, no estado do Pará, reside na cidade de Caçapava, no estado de São Paulo, próximo de Aparecida, onde fica a basílica da padroeira do Brasil. Trabalha com os jovens e a pastoral vocacional. É o delegado mundial dos franciscanos conventuais para a JMJ 2023.
Gonçalo: A comunidade onde vives é uma comunidade que está a crescer? Como é que tem sido nos últimos anos?
Frei Flávio: Com a pandemia, infelizmente, deu uma caída, mas é uma comunidade viva, tem muitos jovens, leigos na coordenação da catequese, ministros da Eucaristia e vários movimentos, como a Ordem Franciscana Secular, a Milícia da Imaculada e todo esse movimento da igreja não só por causa da jornada, mas porque a igreja está voltando o seu olhar para os jovens, então os jovens também se sentem mais acolhidos dentro da igreja; é uma comunidade bem dinâmica.
Como é que estão organizados os jovens e como é a sua participação na comunidade?
Eles têm um grupo de música e alguns já estão inseridos na catequese como auxiliares ou assumindo uma turma. Também temos uma Casa de Retiro, onde tem muito verde e onde vamos fazer os nossos retiros e festas. Os jovens gostam muito de festa. Recentemente fizemos um pedal (uma volta de bicicleta de 10Km) para arrecadar fundos. A inscrição era um 1 kg de alimentos que depois foi revertido para as famílias carentes. Também tem a pastoral da acolhida: os jovens fazem a recepção, passam o álcool gel, medem a temperatura e sinalizam o local onde ficar.
É tudo por autogestão ou há animadores?
Tem uma escala e há sempre há um revezamento. Tem dias que a missa, o canto, as leituras, a acolhida; é tudo dos jovens. Os coordenadores são mais velhos, mas existe muita confiança, a gente conversa muito com as famílias, para os pais saberem o que os filhos estão fazendo na igreja; então é sempre em diálogo com os pais.
Que dificuldades é que têm encontrado e que desafios é que os jovens vos colocam?
O primeiro desafio que vejo em algumas lideranças mais velhas é que não têm paciência com o jovem. O jovem chega e já bate no jovem e ele não se sente acolhido. Tem que haver responsabilidade, mas precisa também ter uma certa paciência, porque o jovem chega na igreja muitas vezes machucado por situações familiares, na escola e tantos sofrimentos que ele passa e, então, a igreja é o lugar em que ele não pode apanhar, não é, tem que ser acolhido com paciência e com um testemunho de fé. Existem muitos jovens no Brasil, porém nem todos estão dentro das igrejas, alguns só participam na Semana Santa que é mais cultural, numa festa do Santo, como o Santo António, quando há um casamento, uma missa importante da família… esse é um desafio.
Depois também toda a questão das drogas que é muito forte, é um assunto que a gente sempre precisa conversar com o grupo, porque sempre tem um jovem que conhece amigos que usam drogas, que vendem, dentro das escolas isso acontece. Então, a gente tem que dar formação religiosa, mas também formação humana para que o jovem, diante dessas opções que o mundo oferece, saiba dizer não.
E vêm neles uma ação para ajudar os amigos?
Sim, muitas vezes fazem-no em particular, não se expõem: frei tem um amigo que está passando por tal situação de drogas o que é que eu faço, com quem converso? Tem também muitos jovens no Brasil depressivos, que se automutilam, com pensamentos de suicídio, também dentro da igreja. Então a coordenação busca fazer esse trabalho de valorização da vida, de dar autoestima, fazer com que o jovem perceba que ele é importante, primeiramente para Deus, mas também para a sociedade; sim os jovens querem ajudar.
Ótimo! Então o que é que te traz aqui em Portugal?
De 20 a 25 deste mês de junho, nós frades conventuais temos uma reunião em Lisboa. Eu vim do Brasil, mas vai ter frades vindos do Uruguai, dos Estados Unidos, de Portugal, Roménia, Espanha, França, Itália, Polónia.
Vamos pensar a Jornada Mundial da Juventude com os jovens das nossas realidades. Esse trabalho com a juventude é essencial não só para a vida da igreja, mas também para o jovem conhecer a vida dos freis e os freis se abrirem à vivência com os jovens. É uma oportunidade para conviver num contexto mais descontraído vivendo esse carisma de Francisco, Santo António e Santa Clara, que, sendo jovens, se decidem por Deus a viver essa radicalidade. Então, também no nosso mundo, hoje, tem muitos jovens que estão sedentos e, por isso, precisamos fazer propostas para esse caminho franciscano.

O Brasil já teve uma Jornada, em 2013, há 10 anos atrás; qual é que foi a experiência de ter uma Jornada em vossa casa?
Na diocese eu era um dos que ajudava. Então, aquilo que vocês estão pedindo, a acolhida para as pessoas abrirem as casas, foi tudo muito bem organizado e daí surgiu um grupo de jovens nas diversas cidades da diocese. Foi um elo muito forte com a comunidade para acolher os jovens. Foi uma experiência muito rica para nós que estávamos na organização, mas também uma riqueza para todos. Tem pessoas que até hoje conversam com os jovens que foram acolhidos.
Percebo! Então quais foram os frutos do pós Jornada ou seja o que ficou na comunidade? Os jovens ficaram mais motivados?
O fruto da Jornada foi a comunidade perceber que o jovem é responsável; claro, é necessária organização, um cronograma, não é simplesmente jogar a coisa para os jovens, mas juntos, ali em comunidade, essa foi a dinâmica, muitos jovens participando. Também no Brasil há diversas realidades juvenis, tem os franciscanos, tem os jovens da renovação carismática, focolarinos, pastoral da juventude… Então a gente conseguiu sentar e conversar, traçar projetos em comum. Sempre tem aqueles que ficam com um pé atrás, que não aceitam, mas é tranquilo, também tem muitos que aceitam, que se abrem e querem a participação dos jovens, percebem que o jovem tem esse dinamismo do espírito de atualizar o evangelho.
E que conselho é que deixas para Portugal?
O meu conselho é: não desanimem. Muitas vezes nós temos uma ideia, um projeto e às vezes a coisa não anda, é necessário calma, não desanimar. E não esquecer a espiritualidade franciscana, você está acolhendo um irmão que vem de uma outra realidade, mas que é cristão, que vive a nossa fé, que também busca esse caminho de santidade. As pessoas que vão acolher os jovens nas famílias que possam também sentir essa presença do Cristo ao receber essas pessoas de diversas realidades. Nos vamos ver na Jornada. Com certeza vai ser um momento muito intenso, único e de grande alegria.
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